Falar de transtornos mentais em seu livro requer muita atenção e conhecimento por parte do autor. Se você quer escrever sobre algum transtorno mental, deve ficar atento para evitar alguns erros.
Um transtorno mental é biológico ou não?
Primeiramente você precisa entender uma coisa, alguns transtornos mentais terão explicações biológicas enquanto outras podem não ter. Ou então, ela terá as duas explicações.
O autor deve ficar atento á forma como a ciência irá explicar aquele transtorno. Isso requer conhecimento do ponto de vista de um psiquiatra e de um psicólogo.
Para notar a diferença, vou usar o exemplo do delírio. É muito comum pacientes psicóticos terem delírios em seus surtos. Existem explicações científicas que mostram como que o cérebro age quando uma pessoa tem um delírio, enquanto tem alguns autores que explicam de forma metafórica como o mesmo ocorre. Então temos de um lado neurônios e do outro id, ego e superego.
Na hora de colher o material para o seu livro, é essencial que você entenda com qual explicação estará lidando. Afinal de contas, o seu leitor pode não saber sobre o assunto, e precisará aprender junto com os personagens. Não adianta colocar uma explicação psicanalítica (que faz uso das estruturas id, ego e superego), e depois dizer que o personagem está fazendo um tratamento medicamentoso… isso irá tornar tudo ainda mais confuso.
Então podemos entender que alguns transtornos já foram estudados e tem uma explicação biológica á seu respeito. Outros não.
Psicólogo ou um psiquiatra
Essa pode ser uma dúvida muito recorrente para quem desconhece a forma como ambos os profissionais trabalham. Psiquiatra é alguém formado em medicina e que fez especialização em psiquiatria. O psicólogo é formado puramente em psicologia, podendo fazer especialização em qualquer abordagem. Lembrem-se disso: somente os psiquiatras podem prescrever medicamentos para tratamentos de transtornos mentais.
Ao escrever o livro, destaque a importância de ambos os profissionais trabalharem juntos. Afinal de contas, o psicólogo faz uso de outras ferramentas para ajudar no tratamento do paciente: seja com diálogos, atividades, etc. O medicamento sozinho não faz efeito sem um processo terapêutico completo.
Vamos supor que teu personagem tem esquizofrenia, ele tem surtos com delírios e não se sente confortável saindo de casa (por conta dos delírios de perseguição). O psiquiatra pode prescrever um medicamento para diminuir os delírios, enquanto que o psicólogo irá trabalhar a reinserção do paciente na sociedade.
Falta de pontos de vistas
Se o objetivo do autor é mostrar o protagonista convivendo com um transtorno mental, fique atento ás pessoas em sua volta. Familiares e amigos podem correr o risco de ficarem doentes. Cuidar de uma pessoa com transtorno mental é estressante, frustrante e cansativo, por isso é essencial trabalhar com eles. Mesmo que saibam que é uma doença, que tem cuidados e tudo mais, alguém precisa cuidar daqueles que cuidam.
Por exemplo: pais de crianças autistas, cuidadores de idosos com Alzheimer, etc.
Essas pessoas que convivem com o paciente, também tem uma história á ser contada. Então, na hora de escrever, tente entender como seria o dia a dia dessas pessoas.
Lista de sintomas de transtornos mentais
Para descrever os sintomas e contextualizá-los em sua narrativa, é preciso entender como que eles agem na pessoa. O escritor pode ter uma boa base de como são os sintomas ao vê-los no DSM-V (que é o atual manual de diagnóstico de transtornos mentais), porém é necessário pesquisar os impactos dos sintomas na vida das pessoas, assim como eu disse no tópico anterior.
Em um caderno, escreva o que achou tanto no DSM-V quanto no CID-10. Delimite quais são os sintomas que você acha mais interessante, para então pesquisá-los á fundo. Recomendo que procure no Google Acadêmico, pois lá irá aparecer artigos científicos. Leia, e anote tudo o que for relevante para a sua história. É possível encontrar dados de pesquisas, relatos de casos e teoria baseada em pesquisa de outros autores.
O principal motivo para pesquisar á fundo os sintomas, é porque cada caso é um caso. Alguns apresentam determinados sintomas, outros não, alguns apresentam surtos agudos, outros não.
Faça o leitor entender o transtorno mental
Esse é o ponto principal da coisa toda. Faça o seu leitor entender como que é ter um transtorno mental. Tudo bem que será superficial comparado á realidade, contudo o ponto á ser debatido é que com a sua história, você ensinará o leitor.
Nunca vou me esquecer de uma fanfic chamada “Psicosse”, onde o protagonista foi diagnosticado com esquizofrenia e tinha de tomar medicamentos para controlar os delírios. O ponto chave dessa fanfic foi vermos que para o paciente é difícil identificar o real e o não real, pois para ele, seus delírios são reais. E como a história narrava, pelo menos a maior parte, a vida do paciente, então os leitores estão sujeitos á acreditar na mesma coisa que ele. Você acha que um personagem é real, e no final das contas descobre que não é.
Conseguem entender como isso pode ajudar o leitor á conhecer melhor um transtorno mental?
Nesse caso, em específico, a autora conseguiu entender como que é um delírio para o paciente. Em seguida, tentou transformar esse conhecimento em uma narrativa coerente, que envolvesse o leitor.
Locais de tratamento de paciente com transtorno mental
Se a sua história irá ocorrer no Brasil, então há uma coisa que você precisa saber: nada de hospitais psiquiátricos!
Atualmente, os hospitais psiquiátricos estão sendo fechados, por conta da luta antimanicomial. Pacientes são tratados em Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Há CAPS para álcool e outras drogas, infantil e transtorno mentais. Um paciente não pode ficar internado pro resto da vida, e nem por muitos dias. Isso é lei! Pesquise á respeito para retratar em sua história.
Esse é um movimento feito nos últimos anos, por conta do péssimo tratamento que os pacientes recebiam nos hospitais psiquiátricos. Se for do seu interesse, recomendo a leitura do livro “Holocausto Brasileiro” de Daniela Abex, uma jornalista que conversou com antigos pacientes do Hospital Colonia, em Barbacena – Minas Gerais. O que levou o hospital á esse título que compara com campos nazistas, foi um psiquiatra italiano que fazia visitas á hospitais para ver pacientes. Após visitar o hospital colônia, ele fez tal comparação “parece que visitei um campo de concentração nazista”.
A partir da visita dele, enfermeiros e demais profissionais da saúde começaram á lutar pelos pacientes, pela dignidade e direitos. A partir de então, muitos hospitais psiquiátricos brasileiros foram fechados.
Conclusão
Falar de um transtorno mental não é apenas apresentar os sintomas do protagonista, é mostrar a sua realidade. Um diagnóstico impacta todos em sua volta, obrigando-os á mudar seu estilo de vida em prol da saúde daquele que amam.
Busque por estudos para tornar a sua narrativa o mais real possível. Evite achismos.